Com Fernández Retamar
Fiz as malas, levo daqui os dentes
que me importam, a lembrança de tudo
quanto me mordeu, também os sons
esses murmúrios persistentes
conheço a raiz que firmaram os mortos
insaciáveis e gulosos, vigiando a luz
e outras presas, com o tempo
eu mesmo refiz o sangue,
integrei os ruídos e o som de pássaros
trago tudo num abalo contínuo,
e de tantas frases riscadas tenho aí
um bosque, rugidos absurdos,
posso ouvir os rouxinóis metidos na gaveta
de cada um, subi os rios
bebendo águas claras com um som
que se intrometia nas veias
essas amadas estruturas daqueles
que se resguardam em tão poucas linhas
com a sua lealdade eterna às coisas ásperas,
armando a partir de ninharias
essa ave que não perde jamais
a sua vida.
Estes sabem dispor secretamente
as intimidades da paisagem
no seu exacto lugar.
Fiz as malas e saí, arrastando tudo,
mas não encontrava a noite, o seu timbre,
essa pura distância com estrelas,
os barcos, o vidro e os reflexos,
as canções de que apenas nos chegam
uns restos, essa noite levantada outra vez
como uma torre, um tremor, tudo
o que oferece luta antes de por fim
se entregar, rendido mais à amargura
do que ao prazer,
e gostando por isso dos homens
e acima de tudo destes
que não fazem outra coisa senão contá-lo,
apegando-se dolorosa, terrivelmente
à vida e às coisas.
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