Estes hábitos esquisitos são já a última
defesa que temos, esta cabeça vazia
onde dou umas braçadas, me afasto
abalando o reflexo da noite
que sou incapaz de ler,
vou-me agarrando como posso a isto
e nem é a noite que faz tanta falta,
mas a sua força,
um ferimento de copo partido e a mão
desfeita de lhe segurar no estribo
a rede estendida para mares ainda
por nascer, um postal que se faz valer
de tudo o que não ficou por cá
a admiração de um verão sem história
com maçãs, os lírios a apodrecerem felizes
numa lata,
abrimos um livro ansiando que a língua
nos seja novamente estranha
fartos dos que estão sempre à vontade
com o que têm para dizer,
das coisas de que se pode morrer hoje
o pior é esta gente que enfia tudo num eco
um som cada vez mais frio
o tempo é agora o último assombro
o seu mecanismo vasto
meio desarticulado, gasto-o
em transcrições e revisões do passado,
com o mesmo sangue vou a outros lugares
leio alto a linha na porta do frigorífico:
na poesia reside ainda a faculdade
de migração da espécie...,
será a coisa mais importante que li em anos
que os nomes são as últimas distâncias
que ainda resistem
não resta assim outro perigo neste mundo
além do ritmo entranhável de uns quartos
com o seu clima próprio,
a lâmpada que atira a sua luz
até ao extremo da vida
imagens que a ligam e trazem um gosto
e um cheiro mais fresco que a carne
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