quinta-feira, setembro 28, 2023


Há outro género de amantes
entre flor e fulgor, lançam o corpo como cartas
marcadas, jogam a dinheiro,
pois há sempre quem pague o gosto adocicado
da carne humana nas diferentes luas,
os que o perderam, que não são já capazes
desse gozo e integridade
a luz que vem da reserva íntima
quando o cansaço se torna um perfume,
depois de verem estreitar-se os céus
sem se levantarem da cama, olhe
se lhe apetecer, entre se quiser
mas feche a porta, por favor 
o frio nem é tão mau mas o ruído 
dormimos junto à estação contando
os comboios que se vão ligando
neste sonho crucial,
temos um horário para os nossos ecos
e o pó ébrio que se levanta transpondo
o pretérito perfeito,
nalguns gestos repetimos a vida
daqueles que uma e outra vez são vencidos 
apesar das histórias que se contam mais
tarde, por defenderem as coisas sagradas
e alimentam o terror tão belos como vão 
levados à corda
e como dos seus corpos suspensos 
nasce depois esse silêncio admirável 
que o comércio na manhã seguinte ignora 
mesmo a noite parece um acontecimento longínquo
quase impronunciável,
só quem aguenta esses pontos que absorvem numa hora
uma vida inteira as infinitas
correspondências o peso da luz somada
se deixa ficar, 
atravessados no ferido som de um raro
encanto
os traficantes do eterno condenam-se à penúria,
mas quando morrem levam o mundo,
sem se denunciarem, por fios enferrujados
e soa enfim essa beleza entre os que escutam
mas são incapazes de dizer sobre isso
uma palavra que seja


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