sábado, fevereiro 18, 2023

Luís Miguel Oliveira e a crítica de cinema que se faz no "Público"

 

O Luís Miguel Oliveira julga-se um crítico de cinema quando na verdade não passa de um afanoso adulador. Anda ali na ordenha das suas vacas sagradas, e mostra-se muito por aí com uns grandes bigodes de leite que vai revirando enquanto finge estar ainda sujeito aos abalos de uma conta que não deveria estar fechada, mas remete-se habitualmente ao papel de um funcionário da ASAE do cinema: lá vem ele com a sua lista de requisitos, normas, os seus impressos e folhetos informativos, e aplica coimas, vem redigir autos a falar do perigo para a saúde pública em nome desse género de cinéfilos que se deslocam algaliados à sala como inspectores muito maçados por abandonarem as suas criptas. Eis um bando de narizes convencidos de que só eles podem desempenhar aquela tarefa, mas se agora, coitadinho, se vê como a vítima de uma terrível purga, um mccarthysmo dirigido contra os pobres dos críticos do Público, eles que, no fundo, só estão ali a pugnar pela decência estética cá no burgo, eles que se pronunciam sobre tudo sempre a partir dos seus dogmas e argumentos de fé, ameaçando de excomunhão quem não respeite a hierarquia daquela cangalha, nos seus textos não há verdadeiramente uma reflexão crítica, e o cinema não é outra coisa além de uma disciplina desgarrada que serve a uns quantos para nos virem com a sua bagagem e vincarem as suas especializações, os vinte e tantos pós-doutoramentos em pintelhices, vivendo empoleirados a compor nas paredes os seus diplomas idiotas, mas, no fim, o que ali temos são almas deliberadamente impositivas. E isto reflecte-se no estilo e na linguagem que usam, dedicando-se a expressar juízos baratos, fáceis e precipitados, sem nunca discutir verdadeiramente aqueles valores que nos impõem, e tornam-se, por isso, a encarnação da presunção. No fundo, são péssimos estilistas e que não se ofendem sequer com a incurável dissonância entre a suposta superioridade das obras que aclamam e aquele registo desleixado, produzindo lixo do mais barato em termos de jornalismo, que é a opinião que se vai espojando em textos marcados por um diletantismo e uma soberba absurdos, que avança deixando uma quantidade de pontos soltos, e em que, no fim, acaba tudo emaranhado, cheio de buracos, curto e apertado, e isto fingindo debruçar-se sobre temas complexos, os quais nunca chegam a dominar. Assim, a crítica que faz um Luís Miguel Oliveira, como é patente a propósito do filme de Vicente Alves do Ó, não é senão o exemplo da mais ilícita usurpação. Ele não quer falar daquele filme, já foi para a coisa indignado por obrigarem sua eminência a aturar aquela estopada, e trata de servir-se da oportunidade para o abalroar e expor as suas preferências, vir-nos falar de um outro filme, não para contrastar, mas para seguir com a sua eterna e entediante prelecção, expondo a sua lista de exigências como um terrorista mimalho e taralhouco, que goza daquela condição de estar num jornal em que os colaboradores da secção de cultura há muito se organizaram como uma maçonaria, bloqueando a entrada de novos membros de modo a garantir os seus lugares cativos, e que ninguém senão eles está em condições de exercer o ofício de avalizadores das gemas do cinema ou do raio que o parta. O certo é que diante da absurda maioria das críticas de cinema que se lê no Público a única vontade com que se fica é a de não pôr mais os pés numa sala de cinema. Estas críticas não procuram informar, alargar a perspectiva de campo e suscitar o debate, mas encerrá-lo. Não são sequer polémicas, mas enfadonhas missas descocadas de uns curas animados pela ideia de se perpetuarem no palanque e entre santinhos de altar numa “província profunda a guisar no seu próprio molho”. E nem são tão parciais e apaixonados nas posições que assumem quanto são desdenhosos, reservando o seu culto, cobrando pelas sessões em volta da pia baptismal, para que possam resguardar-se como uns bispotes numa atmosfera artificial de adoração mútua. Quando o Luís Miguel Oliveira entra na sala de cinema parece estar convencido de que a única coisa que ali merece ser exibida é a sua prosápia, e a tarefa do realizador será negociar com ele os termos para que não faça das outras pessoas na audiência os reféns da sua birra. É como uma espécie de cabeleireiro que em vez de nos fazer o corte, dar uma ideia daquilo de que trata o filme e desenvolver alguns pontos de forma incitante, de modo a que, mesmo que o filme seja um pastelão, se possa ainda reflectir sobre alguma questão paralela, em vez disso, este cabeleireiro entrega-se a uns esquentamentos, põe-se a exibir a urticária e às tantas está com a cultura cinéfila como tesouras a fazer-nos movimentos rasantes e nós ali sentados com aquele imenso babete negro a tentar manter a compostura. No fundo, dedica-se a expressar teorias simplórias, a exibir umas referências que ficam no ar como pó de talco, e que assombram a burguesia decente. Mas quem se habituou a ir ver os filmes depois de ler aquelas críticas já se deu conta de que aquilo não passa de uma teatrada, e que o cinema é só um pretexto para estas pilecas darem as suas voltinhas no picadeiro.


 

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