Neste ínfimo país apenas reconheces
as distâncias implacáveis,
os corpos e o cansaço,
a estranheza que se entranha
até só o escuro poder transmitir-nos
alguma calma.
Gostaríamos de esquecê-lo e por isso
tantos fizemos da noite um hábito imperioso.
Serve-te do isqueiro para ir soletrando
provando o espaço como quem bebe
goles de chá, cerveja se preferires,
sê indelicado, se te apetecer,
no fim, a realidade mostra o seu nojo
por aquilo que dizemos.
Antes tínhamos o perdão dos substantivos,
a textura e o tumulto de impressões raras,
nomes intrusos, e a resina
de umas poucas imagens, o balanço
das ondas a voz trabalhada pelo sal.
Hoje raspamos o que de um anjo sobrou
para a canção, essa ferrugem
de uma espécie aguardando algo mais
de outra, e logo damos pela falta
do mundo,
ainda que o não soubéssemos explicar
nem vender a estranhos.
A dor ensina a encher um copo de cada vez
e a bebê-lo como quem toca um instrumento,
e depois tombas melodioso por aí.
É difícil segurar-se e persistir
tão à flor de nervos desarmados,
saber de si nesta língua de farrapos,
a rebentar de ecos, roncos, entre tantos
remoinhos, regressos a outras idades,
as misturas, e os estragos que isso faz num homem,
a consciência zunindo com um gosto
a tempestade,
e mesmo desconfiando da própria respiração,
vemos o que nos resta com toda a força,
as evidências extraordinárias do que se abate
contra nós,
e se escrevemos é na ânsia
de dar ordens ao tempo,
humedecer-lhe os lábios, deslizar
entre essas formas leves esse modo
de evadir-se, que deixa aos versos
aquele tremor das grandes migrações.
Sem comentários:
Enviar um comentário