segunda-feira, setembro 12, 2022


Sentes já a falta de frases que escreveste
cedo demais, gostarias de levantar esse prego
unindo impressões distantes,
reaver a antiga desordem,
hoje olhamos as mesmas coisas
com os ossos cada vez mais afastados,
tendões e nervos mastigados,
sem contorno para a voz,
ao lado esses ruídos e furos
por onde se escoa  a história,
o seu tambor distante,
as árvores enredam um doce silêncio
bêbedo do que tem em volta,
como lento o vento soa a vivo
tocando um instrumento que não acaba.
A música é um ser imensamente vertebrado,
e disso nos lembram bichos menores 
alimentando-se de escalas decompostas.

Agora que a realidade já cessou e só o eco 
persiste, antes que a vida amoleça,
resta compor em sonhos 
outra anatomia, o mapa do que falta,
com esse sussurro abaixo da terra,
como do interior de barcos definhando
ponderávamos as léguas submarinas,
e a luz que se perdia nos caminhos
para os quais não tivemos atrevimento.
Hoje parece até que temos mais fome,
mas o corpo é quase só memória,
cinza a deixar-se soprar,
a flor amarrando a brisa,
o insecto que nos pousa no lábio
e não nos resta o fôlego que o espante.


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