Ainda demoraremos a alcançar o equilíbrio
e a fragilidade da carne, do osso,
o gosto no sangue dessas belas coisas
que se perdem, e a que nos dedicamos
cantando, exaltando a duração
de um vestido na corda até o sol
dar cabo dele. Mas confiamos ao silêncio
detalhes impossíveis, os nomes estranhos
que guardamos para nos debruçarmos
ecoando neles, e afastamo-nos assim
porque nos sabe bem chorar por aí
à sombra dos deuses.
Essas tardes são lentas como séculos,
felizmente, o tempo não esgota a nossa
substância. Há outras visões que nos esperam,
cortamos os cabos e a terra flutua.
A partir de certa altura de tudo nos é dado
um sinal, e parece ser a presa quem se denuncia
quando a própria vida se habitua a ter-nos
por perto, ganhamos confiança e a rosa
explica como se despe um anjo.
O coração torna-se assim indiferente
às glórias profanas. Então rasgarei estes cadernos,
abandonarei os meus poemas, estarei vivo
para ouvir na folhagem do quadro um pintassilgo
contar os passos da morte, dizer aos outros
que se escondam, e eles indiferentes,
deixando-se levar, rindo alto, num eco
que perdurará dos dois lados do tempo.
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