domingo, julho 21, 2019


Um começo natural ainda seria pior, devolvendo um rasto que já lá estivesse, o balanço sentido como vício, como ainda antes de ti o peso do corpo do pai sobre o da mãe, lias a frase com a sensação de que nela os sentidos estão cheios, as imagens fartas, a perspectiva degolada, quando se fala, não uma língua suspensa nem morta, mas acabada. E saber que há países, épocas inteiras assim. E que grande avanço não seria se não déssemos mais voltas, não virar nem à esquerda, seguíssemos adiante, a ir saber dessas últimas consequências, onde as forças para se animarem assobiam, o sopro de um lado ao outro serve de combustível para caminhar dormindo, arrasando os sonhos, num delírio seco, as impressões espremidas até ao osso, recluso de um ritmo, um passo e mais outro implorando, e isso nos roube a presença, numa queda brutal que se veste, em que o estar perdido organiza as coisas segundo uma urgência, assim põe-me sal, põe-me outro norte à frente, faz que o parafuso rode da forma mais lenta, como flor viva por entre a carne, abre-me uma ferida solar esforçando um raio, um dito onde o cuspo de outros séculos conserve alguma atitude, algo mais nobre do que essa arrogância de achar que porque se está vivo se tem algo que aos mortos faz falta, roda-o de forma lenta para irmos um pouco além do tremor, e se aspire um ar que depressa arrefeça, ter uma estrela debaixo e tu a coseres por cima a pele, respirando com uma força tal por cima da dor para que o juízo chocalhe um pouco, para desmontar o labirinto, as ideias se enfrentem, deixem esse ânimo territorial, se esganem, para que a dúvida tenha então a desejada extensão ao seu redor, um belo deserto, ainda serás roído, espera assim que venham os insectos, que o céu se abaixe e o passaredo te use como caixa de ar, que trilos, que modo de se deixar levar, e que isso te faça rir das antigas convicções, e se desembarace do açaimo a fera, então podemos afundar dessa leveza terrível, atravessar por dentro o olhar dos anjos sobre nós, um desastre que dura, que parece ter fome, e pelo qual passas como se cortando flores.

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