segunda-feira, agosto 13, 2018


Talvez seja só a ressaca de descer de uma tão alta criatura o que de um homem fica para rastro (ligaduras, a casca de um fruto), tendo descoberto pela manhã o ensaio de seda no quarto dela, a metade de uma maçã no espelho, e deste lado nada. O copo no chão, um peixe deitado na carpete, e, se a boca mexe, a cauda já faz parte do padrão. Empurrar portas, avançar pela idade essa invasão musicada e o álcool de que se erguem lentamente suaves vultos cruzando a tua história. Queimado na roupa, nos papéis, esse buraco de perfume vivo ou a simples atenção ao mundo, o olhar animal que tudo volta sobre nós, e como as flores se dispõem em itálico, vergadas por esta luz. Atravessamos a terra, vistos de longe pelos nossos sonhos. Temos vinte anos, uma mão perdida, outra voltando as páginas do jornal, comendo aos gomos uma estrela apagada. As descrições abalaram-nos, tremíamos com o rosto encantado pelos simples factos, luzes fortes no meio das frases, certas variações abrindo sulcos na circulação do sangue. Há dias um homem foi morto ali, em frente aos pássaros. Estão calados, a tarde no meio e o segredo a roê-los; tão distraídos agora que dá para agarrá-los à mão. Corta a flor escura e o pulso erra, mas volta pelo caminho que fizeste virando as sombras com um pau. O necessário antes do mais é dominar a arte de adivinhar, quando bêbado, o caminho para casa; por doçura. A hora perde-se e tu num ramo, o retrato de pássaro escutando esses sons vertebrando o escuro nalgum bosque solene, carnívoro, onde a rosa de um mundo acabado se abre, sorri e desfaz. Do aroma que desloca as paisagens, colhes as ervas, levas ao lume e a cozinha torna-se rumorosa. Levantas a pedra daquilo que escreves, as linhas tremem como se um comboio fosse passar, e perguntas-te quantos passos nos separam das noites naturais a essa visão de um território bêbado. Talvez não passe mesmo de ressaca, meu vinho atento e os cães que não voltam do cheiro dela.

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