segunda-feira, agosto 06, 2018


A lâmpada fraqueja e dá o caminho a essa corpulenta manhã que põe a merda de uns pássaros em sítios altos e cala o murmúrio dos corredores. O quarto desmoronado, folhas a meio de um gesto, um soluço no copo – a mosca que, antes de se afogar, ainda dança na água para desenhar o estertor num silêncio que esqueceu o que implorava. Fiz tempo com uma gente melhor, seres removidos, lustrais. Dessa luz escura criou-se a mesa, flutuando sobre a corrente, e um leme, rude lume sobre um velho mapa celeste. Copiar tornou-se-me, de há uns anos, uma obsessão. Do vício inerente às coisas que li, dei comigo feito um possesso e até, mais tarde, um danado. Avistei o Tigre, sigo-lhe o rastro quente entre gritos e névoas. Extenuado, rouco, sinto cada artéria abreviar a sua rota, o próprio sangue em bicos dos pés. E se já não escrevo, é porque antes filmo, documento e sei de uma certeza acidental as coisas, por aproximação. Feras em sequência, reflexos, perseguidas sob um sol negro. Vocífera mão que me faz as medidas, a estratégia e o cerco. Este corpo no seu avanço indigesto, feito de palavras imprecisas, rituais, como um louco vulgar dizendo o inferno aos balcões. Estranho virado em sonhos, um outro nome por que me chamam. Falaremos disso mais tarde. Por agora, no lado da casa que canta, faz-se um perfume de cuidados, folhas de chá esvaindo-se, o sabão de ervas, a luminescência de um verso tocado pelos sons de uma mulher no banho. A tarde é prometida a uma sinfonia, mas isso fica do outro lado da casa. Deste, os segredos estão cansados. A hora é dos turistas, há que esperar que se fartem como se fartam de tudo. Voltemos assim que a noite os vença.

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