São tantos os lençóis estendidos nas fachadas
que a cidade parece um barco fantasma pronto a zarpar.
A Solidão e a Esperança, duas velhas viúvas, jogam às cartas.
Cristo crucificado vigia desde as varetas de um cometa.
O filho mais pequeno do coveiro arrancou as rodas
de um carrinho de bebé e agora conduz um esquife de corrida.
Por todo o lado há lentos gatos que deambulam
com cuidado, como se tivessem medo de fazer tudo em pedaços.
Gatos negros, famintos, espectrais, antiquados.
Gatos obstinados em ser gatos e nada mais.
Chegaram a esta distante chanfradura do mundo
para velar a mancha cega do oceano.
Por fim o Atlântico: o mar abre-se e fecha-se
como a cortina de uma tragédia inacabada.
Na Praia dos Ingleses um caranguejo inicia a retirada,
arrastando a sua pesada armadura acobreada.
Memória, onde te diriges a estas horas
retrocedendo da mesma forma, embuçada
e torpe, mas desprovida de couraça?
A chuva introduz água nova na velha fugacidade do rio.
Em barcas e lojas os capacetes marciais das térmitas
despertam da sua sesta os cavalos do Apocalipse,
Os segundos perfuram cada minuto e ameaçam ruína.
Uma anciâ benze-se na igreja escorada.
Parece que quer partir em quatro um grande medo
ou afugentar uma nuvem de moscas inoportunas.
Depois de introduzir a sua moeda na máquina
do Senhor, poderá durante uma hora e meia alimentar uma vela.
A vela treme um instante, titubeia e logo se põe de pé.
Vela, esperança de voo curto, barata mascote dos pobres,
o que iluminas? O sacristão agacha-se na escuridão
para calçar com três ou quatro hóstias um velho banco que coxeia.
com cuidado, como se tivessem medo de fazer tudo em pedaços.
Gatos negros, famintos, espectrais, antiquados.
Gatos obstinados em ser gatos e nada mais.
Chegaram a esta distante chanfradura do mundo
para velar a mancha cega do oceano.
Por fim o Atlântico: o mar abre-se e fecha-se
como a cortina de uma tragédia inacabada.
Na Praia dos Ingleses um caranguejo inicia a retirada,
arrastando a sua pesada armadura acobreada.
Memória, onde te diriges a estas horas
retrocedendo da mesma forma, embuçada
e torpe, mas desprovida de couraça?
A chuva introduz água nova na velha fugacidade do rio.
Em barcas e lojas os capacetes marciais das térmitas
despertam da sua sesta os cavalos do Apocalipse,
Os segundos perfuram cada minuto e ameaçam ruína.
Uma anciâ benze-se na igreja escorada.
Parece que quer partir em quatro um grande medo
ou afugentar uma nuvem de moscas inoportunas.
Depois de introduzir a sua moeda na máquina
do Senhor, poderá durante uma hora e meia alimentar uma vela.
A vela treme um instante, titubeia e logo se põe de pé.
Vela, esperança de voo curto, barata mascote dos pobres,
o que iluminas? O sacristão agacha-se na escuridão
para calçar com três ou quatro hóstias um velho banco que coxeia.
- Jesús Jiménez Domínguez
(tradução de Jorge Sousa Braga)
in “Contra Las cosas redondas”
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