segunda-feira, fevereiro 11, 2008

Meramente académica

Cansado desta merda toda, parir palavras páginas e páginas qual mãe negra do bronx: sem dor, e na vaga esperança de que ele nasça branco, tão provável como um cabelo na cabeça de um careca ou um esquimó no Gobi (estou a ficar repetitivo), ou pelo menos com os membros todos. Enquanto se vai tapando o medo com uma ironia comprada por uma bagatela ao Swift, afogando o cagaço de mancebo na primeira batalha na derisão, diz Lobo Antunes ou digo eu?. Talvez o problema seja este: a citação constante e despropositada, sou um monte de notas à margem, ditos espirituosos meticulosamente organizados, decorados, merda, decorados. Sou um autómato com boa memória e pouco mais. Enquanto chafurdo num lamaçal de influências incompletas, atiradas por cima umas das outras, numa heterogeneidade pouco recomendável, vou ensaiando uma voz única. Caralhos para mim e para isto se tenho voz, desconjuntado monte de detritos literários, creio que os cientistas têm um nome para isto, monte de merda, creio, não tenho voz nem sistema vocal nem boca que seja. A grande habilidade de que sou capaz: (triste espécie de paquiderme que toca a campainha a preço de um amendoim ou moedas pretas) moldar a forma da merda para que pareça merdantunes ou merdaniel faria ou o raio que o parta. Merda arrumada em paralelepípedos salpicados de tinta e ilusões e nada mais. Este estilo pretensamente descomprometido e corajoso, quando não passa de brejeiro e vácuo. Ou a mania analítica, sou um analista exímio, acreditem, perícia alcançada pela maceração do que sou, a moagem do que penso ou digo ou escrevo. Já vos disse que tudo isto serve apenas o propósito de me mostrar falível e humano? (quando sou infalível e genial), ou que o faço porque não tenho outra maneira de ocupar o espaço em branco no monitor? para que sintam pena, ou se riam, ou reagem, seja de que maneira for? ou, imagine-se, já imaginaram?, porque é verdade.
A última hipótese é meramente académica. Está na natureza das coisas, a verdade ser uma invenção académica. E esta é a verdade.

4 comentários:

Diogo Vaz Pinto disse...

este tipo de textos não se elogiam, mas que se foda - muito bem!, não te falta espirito e se continuares a brincar assim com as palavras vais-te tornar um tipo muito sério, e mais importante, um escritor realmente interessante

Artur Corvelo disse...

Que se foda, de facto. Obrigado.

David disse...

Arranjem um quarto, vocês os dois!

Agora quase a sério, meter merda e daniel faria na mesma palavra é de valor.

Nuno disse...

o diogo tem razão, um texto assim não se elogia.. por isso eu digo: mas que grande merda de texto, numa lógica dos lugares inversos, e ler merda assim é bom, pronto.