segunda-feira, dezembro 08, 2025

O Anticrítico leva porrada da grossa nas páginas do jornal A Batalha



Nulidade impante que é, António Cândido Franco dá sempre a impressão de que escreve como quem falasse de boca cheia, salpicando-nos, e baralhando tudo, ele empanzina e estrebucha, a corrigir um tropeção noutro, com um talento inegável para fazer de cada semente de bronze outra pevide, tão habituado às ensaboadelas académicas, e a pôr aquele ar grávido de quem sobe à tona para cuspir um jacto depois de um amargo estudo nas profundezas. Basta o arranque do texto em que, no mais recente número do jornal A Batalha, quer vir para um ajuste de contas com a edição de O Anticrítico (2023), onde levou uns bufardos, para esbarrarmos naquelas imprecisões que, mais do que desleixo, procuram dar saída a uma prosa que se quer cozinhada na evidente sopa do revólver, e começa por anotar que fiz uma formação "típica" de quem veio "depois da revolução e do seu Termidor" (mas e ele o que sabe ao certo da formação que fiz ou deixei de fazer?), e adianta que a Língua Morta, sim, que se vai mostrando “com gosto e algum acerto”, e depois de assinalar um conjunto de frechadas bem apontadas no meu volume de crítica, vem esbarrar num “louvor sincero” a Agustina, e trata logo de provar que não leu o artigo, pois finge, distorce, aldraba, afirmando que o elogio que ali é feito enaltece acima de tudo “o talento verbal da autora”. O texto está disponível online e qualquer um poderá lê-lo e constatar que António Cândido Franco não o fez. E esta começa por ser uma distância enorme que me separa de quase todos os outros supostos críticos literários. “Pois é, eu leio. Tenho contra mim esta ridícula maneira de proceder.” E nem vos faço o gosto de dar o seu a quem de direito, pois tomo muito assim um balanço na base do furto, embora preferisse que me pudessem apreciar a fazê-lo com maior violência. Mas não vamos aqui perder muito tempo com subtilezas ou correcções, sejam elas de pormenor ou dessas que desmascaram um bigorrilhas no acto, isto porque seria tomar como séria a intenção, fingir que se tratou de desmazelo, quando o que tem sido mais constante é esta de virem para polémicas umas pobres cabecinhas transtornadas, a lançar calhaus a algum espantalho, e a coroar-se de estandartes como num torneio de cavaleiros, enquanto me vão pintando um retrato que não é outra coisa senão quem lhes apetecia que eu fosse. Para isso, torna-se essencial desnatar-me, desconsiderar tudo, aproveitar-se da caricatura que fazem os que vivem na pataqueira, sempre no esmolar da intriga, pois é assim que se fazem os ajustes de contas entre nós, tendo por base só aquela meã consciência atafulhada de vegetações das que ficam a criar bicho no miolo de tomos nunca lidos. E isto vai servindo a uns que também querem fazer asua reputação de monstros por escrito. Não vamos agora queixar-nos muito disto, sendo coisa de somenos, se tanto mais nos temos queixado de que hoje andamos tão mal servidos de duelos. Mas, com Agustina e os que mais se seguem, ACF serve-se de um truque bastante óbvio, que é dirigir-se a quem não lê, e se fica pela boataria, pegando nas figuras que parecem mais fáceis de despetalar sem uma apreciação mais funda, e isto para seduzir aquela flor da imbecilidade que nem raízes tem, mas se alimenta da peçonha desdenhosa que anda no ar, completamente desinteressada de alguma justiça que se possa fazer aos poetas ou aos raros que, em vida destes, os trataram como a príncipes, estes poetas que estes outros depois não se cansam de cercar com esses pasmos laboriosos boquiabertos. E se o trabalho do Manuel Hermínio Monteiro nunca impressionou ACF, que prefere tomá-lo como suspeito porque ficou comendador aos 40, hoje também se pode notar como foi convenientemente esquecido, quase apagado, ou vilipendiado por qualquer um desses biltres que, em vida daqueles poetas, não estamos bem a ver o que fizeram para lhes salgar os caprichos (e a Cesariny convinha ter dado a tempo um pouco do que era de César e até de Deus antes que se tornasse mais outro engavetado, outro falecido desses tão rendosos para enchoriçar na cátedra ou vir biografá-lo), mas bem vemos agora como as suas obras são transformadas por biltres de toda a laia numa espécie de cantilenas entoadas nos lugares mais infectos. E, neste ponto, talvez valha a pena notar como ACF, que começou esta recensão explicando que este tão dissimulado charavaneco (eu, EU), depois da tal formação tão típica de qualquer filho de oficial, qualquer rebento de burocrata, logo deixou claro que andava doido por poleiro, comendas, este que, no final de contas, está é apostado em furar o esquema aos autênticos salteadores, quando, no fundo, quer é repor a hierarquia. Pois. E diz que vim pela literatura, fui despachado, estão a ver, estilo agente-duplo sacânico, a vestir a pele do pelintra, infiltrar-me na resistência e dar os códigos do comando. Estava eu nisto, compenetrado e a ter grande sucesso, mas este Chewbacca topou-me. Diz que fui fazendo poemas, e ele contou pelos mil dedos centopeicos de leitor-toupeira, contou e diz que entretanto já vão em “muitos”. Já eu, e quanto aos dele, não sei se escreveu muitos ou poucos... tendo, contudo, a inclinar-me para esta última, pois se não chegou a escrever nenhum de jeito, e eu li-os, todos os que me deu a ler tão desnecessariamente, tendo-os reunido depois de uns vinte e tantos anos de desgastes (por fim, ao que parece, deixou-se daquilo) com o selo da Quasi, tomando Jorge Reis-Sá por seu editor, e creio até que estimado. Portanto, e quanto aos juízos de ACF em relação aos nossos editores, creio bem que o assunto está arrumado. Mas parte daí para, logo a seguir, querer lavar a honra do editor recentemente desaparecido da Antígona, Luís Oliveira, e, por esta altura, a única recomendação que lhe posso fazer é que o melhor será reservar umas termas por uma larga temporada, esfregá-lo todo, ungi-lo bem, coisa em que, de resto, ACF tem já uma larga prática. Pois se é um desses que, para nos distrair da sua indigência mental, se especializou em ir escavar nos jardins de lápides a matéria para fazer a broa, pondo-se até a imitá-los com infantil gravidade... ACF está sempre na ficha e entre os membros dessas sociedades de amigos de tal e tal ilustre falecido, sendo um dos nossos mais destacados biógrafos-e-santeiros, amadores de relíquias, um dos mais constantes entre o pulguedo migrador atraído pela putrefacção da glória, anda sempre nessas operações que, através da mais vulgar alquimia fúnebre, atinge as obras de um modo em nada diferente do germinar da bicharia na carne. Tem aquela coisa de escriba-verminoso que se senta à mesa e produz bibliografias passivas como quem julgasse assim engordar o seu próprio destino. E é com estes escritos de um sacristão leproso que, no fundo, não percebe patavina, mas persiste entre o nosso círculo de basbaques como uma das nossas mais esfaimadas marabuntas da interpretação. E é, assim, a ele, como a uns poucos mais, (António Cabrita, António Carlos Cortez… são os que logo ocorrem pondo o dedo no meu índice onomástico), que dá vontade de fazer aquela pergunta colocada certa vez por Jodorowski: “Para quê todo este circo? (…) Passar do eterno ao efémero por uma sede de espelho?”

Ora, no nosso meio literário, como já fomos notando em tantas ocasiões, à semelhança do que ocorre em qualquer camorra, também temos os fixers, esses agentes de facilitação, mas que, em lugar de tarefas meramente ingratas ou indecentes, em vez de uma certa desenvoltura ou habilidade para os actos sujos, o que temos neles são pequenos sabujos, tipos que se ocupam de alimentar as torpezas, os equívocos e confusões de toda a ordem, fazer a propaganda daqueles que os acoitam, enaltecer os senhorios, branquear manigâncias, tudo em troca de uma porção maior da ração, e assim põem a cassete de outros quantos, para dar a sensação de estão amatilhados, e ladram para dar a ideia de que a propriedade se mantém inviolada, zelando assim pela integridade dos casais e quintas. Não há, por isso, um só desses sacripantas que organizam o regime de tutela no campo cultural que não se faça cercar destes aleivosos nairecos. Corifeu desse centro piolhoso, catequista ao serviço da integração dos saberes como matéria esotérica, sempre a baralhar cadáveres, sempre a capitanear as hordas de canibais homenageantes, sempre numas fanfarronadas confusas e atabalhoadas, essa sensação de patranha a fingir erudição, a remexer baldadamente nos volumes de oitocentos, a acrescentar despropositadamente informações demasiado circunstanciais, e a expor-nos as varizes da literatice com orgulho, para provar as horas que passa de pé a fazer a segurança no museu da coisa… Este é o nosso António Cândido Franco. É o tipo de pregador que mal se debruça sobre um texto, põe-se a carburar, e logo o esturro cheira a incenso, desata numas moralidades, sempre com uns fervores, numas prédicas, mas, depois, não consegue impedir-se de cuspir uma mosca ou outra. É claramente um resto desses tantas vezes requentados de um Teófilo Braga, esse de cujos livros Camilo disse serem uma balbúrdia, com os seus “retraços de ciência apanhados a dente, mal mascados, um cérebro atrapalhado como armazém de adeleiro, golfos de bolo não esmoído… coisas apocalípticas, muito desatadas, e tudo em prosa deslavada, derreada, exarciada de galicismos, caótica, apontoada de enxacoco de retalhinhos apanhados à toa numa canastra de apontamentos baralhados e atirados para o prelo”. Isto traça-lhe perfeitamente o tom, o estilo e, sobretudo, a estratégia e alcance. 

E é com tudo isto, e com aquele hemorroidal do cérebro que, numas horas lhe dá para se mostrar muito cioso das suas baboseiras retocadas, sempre a coser à lapela algum emblema de mais uma seita frustre, que depois de reconhecer que se o “cartapácio” de que me servi para declarar guerra não tanto a meio mundo, mas sobretudo a essa província carunchosa que é o nosso meio literário, onde ACF tem prosperado com um franchise especializado em fumeiro, se este tem aspectos meritórios e simpáticos (e vamos ver o que nos diz depois de mais esta atençãozinha que lhe faço), acaba por assinalar que, o que se engole lendo os textos de forma isolada e ocasional, já não se atura por grosso, revelando “inanidades insuperáveis”. Quais sejam elas ficamos sem saber. O que já se sabe, e já nem me lembro quem foi que o disse primeiro, é que o ressentimento é um veneno desses que um tipo toma na esperança de que outro cabrão morra. E ACF nunca se refere ao texto central no volume em que lhe são desferidas umas boas lostras. Dispensando-se de qualquer fundamentação, e apenas citando a despropósito uma que outra frase, que tudo ali redunda num “desbaratar de palavras num frenesim sem alvo nem interesse”… É claro que se falhou o alvo, como comprova o facto de ele ser um dos mais evidentes alvos, não tendo demonstrado a menor vontade de relembrar os leitores dos motivos porque foi visado. Então, propõe antes um juízo redondo, rotundo, uma espécie de maledictio. E uma vez que este me enobrece e é motivo de orgulho, interessa-me destacá-lo, envergá-lo, e, se pudesse, até fazia uma cinta para envolver o “cartapácio”… “É por isso que estas 700 páginas são, assim em conjunto, um desperdício e um logro. Não passam de agitação – excitação vã” (…) “Nada é tão verdade neste livro, como a sua capa, onde vemos um garotinho a atirar bolas de neve.” A verdade é que mesmo esta capa não foi escolha minha. A minha preferência foi sempre para aquela que ilustra este artigo, e o editor até me concedeu o favor de mandar fazer uns 50 exemplares com a capa que eu preferia. Depois ACF faz questão de sublinhar como tenho escrito nos últimos meses para a revista Ler, sendo que ali fiz um elogio sem as menores reservas à poesia de Vasco Graça Moura. Claro que para ACF é igual ao litro estar a falar do poeta ou do articulista que atirava a matar na oposição parlamentar, e do PS!, veja-se só. Além disso, tão pouco recomendável bardo era dos tais que chegou a ocupar um lugar no parlamente europeu, sendo eleito nas listas do PSD. Portanto, mais valia arrancá-lo das antologias e meter no lugar dele ACF ou algum dos seus compadres. Seja como for, aí está!, mais outra prova de que ando metido com o poder, e o mais certo, garante ACF, é que em breve me possam ver a assinar um “louvor sincero” ao presidente da Academia das Ciências de Lisboa. Não sei quem seja tal personagem, mas tem já um pouco da minha estima e solidariedade se foi eleito como a suprema megera do nosso sistema por este nosso grande heresiarca. Curiosamente, e como já acontecera antes, quando me foi dirigido um outro ataque na forma de colagens por parte de outro dos nossos zelotas, talvez para não conspurcar os meios oficiais onde estes anarcalhotes de fim-de-semana também prestam os seus serviços, escolhem sempre as folhecas apocalípticas, o que me faz sempre sentir muito honrado, pois acabo ao lado de carniceiros e gente realmente do piorio, e assim parece que já fiz o suficiente ao escolher ir pelas letras, e também eu tenho a honra de ser um homem odiado. Talvez a minha obra maior tenha sido mesmo a de condenar estes jagunços, que se tomam por meus figadais inimigos, a unirem-se e irem ao ponto de fingir uns pelos outros algum amor e até um propósito comum, elegendo como acção urgente pôr cobro a este flagelo que tenho representado para as reputações literárias. Fico comovido, é claro, e espero mesmo pela continuação, ao lado dos abusos das grandes corporações e do patronato, da desmatação das florestas, entre crimes ambientais, massacres de populações indígenas, guerras genocidas, fico comovido de ver como estas figuraças de alto coturno escolhem estas folhas para arragaçar as mangas de alpaca, e me enfiarem nos seus “gorjeios canoros de armar ao pingarelho militante” (VST). Agrada-me ser colocado ao lado dos facínoras, e isso prestigia-me quando tudo o que fiz foi mostrar que há um caminho para a crítica, uma forma de desagradar profundamente a estes que, assim, e no intervalo dos colóquios e das caldeiradas com patrocínio oficial, sempre com o pretexto de roer ossos marginais, nos explicam porque vamos dando com qualquer uma das nossas mitologias sempre tão desprestigiadas, ratadas por este género de militantes.


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