O tempo viria a ser preterido, uma
distância para o consumo de si e dos
outros, sem a menor ânsia de distinção
acorda-se sem boca, os nomes
pertencem já a uma outra espécie
vidas que abandonámos ficando na cama
como se toda a resistência fosse
a de um mundo que deixámos de julgar
a lenta influência da galáxia omissa
desse pingo feroz desligando-nos da carne
e o escuro esse talento que os anos
reúnem a nosso favor, a trégua de se
ir sufocando as memórias, trocar
o passado por alguma canção
ter um apetite como se tem um vago
dom musical, o ouvido, a atenção submersa
mãos enormes alcançando
as notas em toda extensão que nos pediam
outros corpos, como uma escrita
em que cada breve e humilde linha
prolonga um tom que de outro modo
teria desaparecido.
A displicência torna-se assim uma paixão,
atravessando a época fiel a uma antiguidade
inventada, numa prece vegetal
em que raízes e talos brotam
para acomodar-nos, um junco sustendo
um telhado, um caule tenro aquela estátua
sentada que ampara a nossa dissolução,
estas mesas onde dormimos à tona
de que horas, as lentas passagens
sem rumo, e se tudo é um resto
duvidamos inteiramente das evidências
e contados os dias conta-os outra vez
assim faremos a morte desistir de nós
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