Acumulo sono, forço-me à vigília
testo espécies estímulos borro os dias,
não me deito, vivo numa perpétua
ressaca, e depois procuro-te e peço
aquece um pote ervas o que quiseres
deixa-me um pássaro num quarto de hotel
assim inundo-me de murmúrios
e gorjeios, com uma garrafa a minha flor
preferida, e os restos deliciosos de cada ronda
no esforço de fecundar a insónia
vou até onde deveria estar o nosso alpendre
indago sobre o custo de vida por estas bandas
já não sei beber, nada daquilo mexe
cá dentro, acabo por gastar mais
na gorjeta para o barman, depois chove-me
demasiado nos sonhos, tenho baldes
espalhados por toda a parte, eventualmente
acordo, muitas vezes ao relento
coberto de caranguejos, algas,
arrasto-me encho-me de febre
e deliro com a simples leitura dos jornais
isto nos dias que as mulheres escolhem cruelmente
para ficar na cama…
Vejo filmes mudos, folheio revistas
com décadas, e oiço-a repetir
mesmo morta hei-de voltar a este mundo
para fornicar. Que saudades, Mansour,
do teu quarto, da cama de que sinto ainda
o cheiro terrível, doce, à cabeceira
a tua magnólia com sangue nos lábios
e o universo a pingar daquela torneira,
um som cavo que escavou a porcelana,
uma borboleta liberta-se e vem pousa
no teclado, ajuda-me a reaver
o contorno do que tenho perto,
as pinceladas, essa boca,
tudo entre pincéis latas de tinta restos
de sémen, os detalhes que mais
nos provocaram, aquele visgo
destilado de cuspo de rouxinol e assim
colo pedaços tempos numa ordem adversa
levantando este pó de reticências e
faço barulho viramos tudo inchando
um rumor que perturbe de longe
essa gente com quem dormimos
e depois saímos damos caça ao que aparece
e é bom sentir que se preciso ainda coramos
seguindo alguém na rua nesse método
de oração que aperfeiçoámos, e nisto
já levas cinco centímetros de dilatação
a enfermeira diz que está a meio caminho
das Hébridas e de outras montanhas,
daqui a um bocado já pariste o sol
e eu estarei cá fora com o resto
dos rapazes a gabarem-se
de te terem tido, comparando o sabor
das ostras ao gozo de comer sereias.
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