terça-feira, julho 26, 2022

Os produtores da hortaliça biológica editorial



A edição independente em Portugal têm-se mostrado tantíssimo inovadora na sua sanha de reformular suportes. Vive de propor à circulação toda uma gama de redefinições e sucedâneos do livro, relançando o horizonte, indo buscar ao cemitério as técnicas de impressão mais diversas agora calibradas para usos sumptuários. Assim se erguem essas oficinas onde todo o cuidado é dispensado em intervenções e cirurgias plásticas, estendem-se estufas onde engenhosos cientistas do panfletinho, do poster, criam as suas hortaliças e couves onde imprimem os seus códigos deontológicos e disciplinares com infinitas cláusulas e um deslumbramento absurdo pelo ofício. O centro de publicações especializa-se no auto-elogio, ilustrando com uma bonecada muito reguila, gatafunhos de arrepiar, e provoca escândalo com os seus slogans, palavras de desordem, a compor quantos-queres mal-criados. Anda por aí toda uma dinâmica decorativa que faz bem às paredes e estantes dos cagões cheios das suas causas e com o mapa das suas consciências aberto na mesa de operações. Vão trabalhando nesse Frankenstein de encher o olho, comover papalvos, e até parece que se estão a preparar para fazer alguma coisa, enquanto se distinguem dos literatos, na sua aristocracia que enverga a camisa de flanela e as jardineiras todas cagadas de tinta como farda, e ali se reúnem, nos calabouços, ao leme dessas mírificas tipografias navegantes. Há nestas oficinas uma militância de práticas e técnicas ou relações marcadas pelo anacronismo, mas tudo isso é representado e publicitado de forma constante com recurso às novas tecnologias e redes de comunicação, numa encenação que faz destes agentes enfaticamente retrógrados uns exibicionistas muito empenhados nas suas recriações de concepções românticas de um certo meio cultural e que exprimem o desfasamento entre as aspirações e os verdadeiros desejos desta classe de proletários da sua esplendente auto-imagem.

 

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