(Em março)
O que antes era certo agora não encontra
o seu lugar. Não o encontra e é de dia,
e vai distraído como vem de longe
o manancial, que soa a luz perdida.
Distraído eu também à força de ânsias
cálidas, de manhãs inauditas,
eu vi no incenso das obras fundamentais
e na minha escrita branca uma alegria
dispersa de vigor. E não se ergue já
tudo para o beijo? Não se ilimitam
as estrelas para algo mais belo
que um recair oculto? Se a vida
me convocasse do eixo de meu corpo
como a luz entre pinheiros à fria
respiração da lua, porque agora
posso, e agora está ali... Mas não: brisas
de alpestre silêncio, alijeiradas
aves que se detêm outra vez
seu vôo num equilíbrio antecipa-se.
O que antes era certo, o que antes
era simples: um grão que germina,
de súbito. Como se nos antecipa o único
mês desde o exterior. Cheira a ti, imita
a tua beleza, a noite as tuas palavras
– tu sobre o friso da amanhecida.
E que não possa ver a minha cidade virgem
nem a minha pedra molar sem andorinhas
oblíquas despertando a muralha
para perceber que nada, ninguém emigra!
Oh, plumas timoneiras. Mordedura
da celeridade, mal conservada
se o machado canta ao pássaro limitado
aos bosques finais e a própria terra
salta como os peixes no verão.
Eu que pensava noutras distâncias
no centro da minha névoa cerrada,
que pensava não do topo, mas por cima
da ebriedade. Assim... bastar-me-ia
afastar os cabelos, entreabrir
os olhos, recordar-te em qualquer vinha!
Rugoso coração a todas as horas
brotando aqui e ali como semente,
ouvi-lo bem: não tremo. É o olhar,
é a água que espera ser bebida.
A água. Entristece ao contemplar-se
nua e já com março quase grávido.
De que forma nos devolve o eco
as nervuras das folhas vivas,
a plenitude, o fumo religioso,
o granizo a assaltar as avenidas.
Algo há que reter para os tempos
enquanto rodam as antigas rocas. Perdidas.
Ah, nomeá-la. Ela diz, ela disse-o.
Voz titubeando os lábios, sendo cifra
das fantasias! Não mais desta bruma,
não mais de tardes timoneiras, limpa
do imortal deslize que chega ao seu lugar
confundindo a dor ainda que seja de dia.
- Claudio Rodríguez
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