(Ainda março)
Tudo é novo talvez para nós.
O sol claroluzindo, o sol-pôr,
morre; este que sai é cada vez mais
forte e alto, é distinto, é uma nova
forma de luz, de criação sentida.
Assim cada manhã é a primeira.
Para que a vivamos eu e tu sozinhos,
nada é igual nem se repete. Aquela
curva, de suaves amendoeiras em flor,
ontem já florira? A ave aquela,
não voará em círculos mais abertos?
Depois de ter nevado o céu encontra
esplendores que antes eram nuvens.
Tudo talvez seja novo. Se não fosse,
se a meio desta hora as imagens
de outras cobrassem vida, e com elas
as lembranças de um dia já passado
voltassem encobrindo o de hoje, voltassem
aclarando-o, sim, mas ocultando
a sua claridade nascente, que surpresa
traria ao meu ser, que devaneio,
que nova luz ou labores novos?
Água de rio, água de mar; estrela
fixa o errante, estrela no repouso
nocturno. Que verdade, que limpa paisagem
a do amor, que nunca vê nas coisas
a triste realidade da sua aparência.
- Claudio Rodríguez
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