segunda-feira, maio 21, 2012

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Nunca será de mais repetir que a arte é um caso de forma e não de conteúdo. É totalmente desajustado o esforço do escritor que alimenta a obra com informações raras e finas análises. O pensamento analítico é uma coisa, e a arte outra totalmente diferente. Há meios mais ricos, mais expeditos. Que num ápice, em meia linha (veja-se Céline) nos transmitem aquilo que o pensamento analítico, com os seus pés pesados, em todo um volume não consegue enunciar. Durante muito tempo, também a pintura julgou seu dever dar aos cristos e às virgens expressões engenhosamente renovadas. Mas só fez a sua revolução quando viu que devia substituí-los por maçãs, cálices de absinto e maços de tabaco. Revolução esta que foi centrar a invenção, não já na escolha do objecto figurado mas nos modos materiais utilizados, nos modos de transcrição, na sintaxe. Que asas então lhe cresceram! Que voos não começou, desde então, a dar?

- Jean Dubuffet
(tradução de Alberto Nunes Sampaio)
in prefácio a O Cão de Deus, Hiena

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