Ando em busca de um verso que saiba
parar um homem a meio da rua,
um verso que se tenha de pé – aí está a diferença –
que até estenda a mão ou cuspa.
Poetas: persegui esse verso,
insistam, brandindo-o, e que estale
rente ao homem – arado, e foice, e gadanha –,
aconteça o que acontecer, sim!, doa a quem doer.
Somos a escória, o carnaval do vento,
ridícula terraplenagem, com o cu
de fora e a camisa aberta, agitando-se.
Ando em busca de um verso que se sente
entre os homens. Que se meta à besta,
se ponha a olhar Tachia descaradamente.
e 2
Falo do que vejo: do balcão
e do copo; do varão e das suas duas mortes;
escrevo aos gritos, digo coisas duras que
se interessam até por Deus. Assim se fala.
Venham ver o meu verso descer a rua.
A minha voz em pelota debaixo da canícula.
Poetas chatinhos, gente ridícula.
Todos tão convencidos. Calem-se!
Falo do meu cárcere: uma língua
desavergonhada, com as mãos no alto-falante:
«Tachia!, que me dizes, como, onde, quando?»
Escrevo como cuspo. Contra o solo
(ah esses reles poetas, falando baixinho,
os filhinhos dos papás) e contra o gelo.
- Blas de Otero
in Ancia, Visor
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