quarta-feira, fevereiro 24, 2010

Um brilho derramado, um ouro inútil

Penso na minha vida, depois olho a beleza
que tão alheia a mim amadurece e morre vertiginosamente.
Essa formosura efémera como um fruto perfeito
que se solta do ramo e desenha no ar
um brilho derramado, um ouro inútil.

___________________________E digo para mim:
«Se eu estendesse as mãos com o arrojo do valente, se soubesse
fazer meu outra vez o prodigioso meio-dia
em que a luz estava como ancorada no céu
num presente imóvel que em mim achava sua origem».

Mas sei-me vencido. E nada tento nas horas desertas
em que me fere a nostalgia de tanta plenitude.
E reconheço nesta paz vazia
que já tudo está longe e não se pode agora
voltar a essa ventura, ser de novo tão livre
como naquele tempo que o esquecimento arrebata à memória,
quando todas as coisas eram minhas e eu possuía o mundo
com a ousadia e a inocência de um deus adolescente.

- Eloy Sánchez Rosillo
(tradução de José Bento)
in As coisas como foram, Assírio e Alvim

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