Obrigado, ódio; obrigado, ressentimento;
obrigado, inveja:
devo-vos quanto sou.
O pior de nós mantém o mundo a andar
e a ira é um dom: estamos vivos.
A que demónios pertencem os sorrisos,
esbanjados feito mercadoria barata,
nunca me dei ao trabalhado de averiguar.
Obrigado por não me deixares ser inconstante e doce
enquanto o mundo ergue a sua minuciosa obra de dor
e nos fazemos mal uns aos outros
amando-nos às cegas,
com torpes estaladas.
Eu sou essa pergunta da insónia
e a sua horrível resposta.
Beija-nos na boca, multidão, e esfuma-te,
que estamos sempre sós e não somos felizes.
Obrigado, angústia; obrigado, amargura,
pela memória e pela razão de ser:
não quero que me desejem ao preço da minha vida.
Obrigado, senhor, por me mostrares o caminho.
Obrigado, Pai,
por deixares que teu filho seja Caim.
- José Luis Piquero
in El fin de semana perdido, DVD
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