quinta-feira, junho 23, 2022


Estão dispersos os Mundos, mal se ouvem
e as estações que podiam vir
soam baixo demais - graças a deus
pelos loucos, aflitos,
os poucos que se governam ainda
e estão cheios de tempo, atentos a sinais,
aos cliques na linha, ao surdo zumbido cósmico
perturbando a emissão; há um ponto ali,
regista, um furo, anota, um resto do flash,
meses num fio ligando detalhes
num monte de cadernos.
Vê aqui como alguém cuspiu nesta página,
limpou com a manga o próprio nome, 
ainda deixou um esquisso do seu fantasma.
A cada corpo sucede uma invisível extensão,
a pele onde se reflectem estrelas
de um céu ainda por ordenar,
como manadas ligeiras
que em águas mansas saciam a sede, 
andanças aluadas de adolescentes
conduzidos pelo mesmo assobio rasante,
partilham alguma caixa de pincéis,
os frascos de minuciosa tinta,
esta flor que ilumina uma vida inteira
deixando cair as pétalas do acaso
ao nosso redor. Inspiramos o perfume
de novas suspeitas e quando os quartos
nos parecem mais escuros ficamos imersos,
trabalhando os contornos e o murmúrio
mais íntimo, como a abelha
dominando orgulhosa o seu fraco poder,
só que o mel ainda é pouco, é preciso mais
um corte, fazer despenhar
um estranho cometa na superfície da voz,
e traçar uma linha firme mais fundo
para que a luz irrompa no meio do caos.


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