quarta-feira, março 18, 2015

ars magna


Devo ter corredores por onde ninguém passe devo ter um mar próprio e olhos cintilantes
devo saber de cor o ceptro e a espada
devo estar sempre pronto para ser rei e lutar
devo ter descobertas privativas implicando viagens ao grande imprevisto
de um pássaro as ossadas de uma ilha a floresta do teu peito o animal que inanimado canta
devo ser Júlio César e Cleópatra a força do Dniepper e o carmim dos olhos de El-Rei D. Dinis
devo separar bem a alegria das lágrimas
fazer desaparecer e fazer que apareça
dia sim dia não
dia sim dia não
devo ter no meu quarto espelhos mais perfeitos técnicas mais sérias prestígios maiores
devo saber que és forte e amplo transparente e colher-te murmúrio flébil aureolado
que eu arranco da luz que encharca o mundo
dia sim dia não dia sim dia não
devo portar-me bem à saída do teatro
devo dar e tirar as chaves do universo
num passo ágil belo natural
e indiferente ao triunfo aos castigos aos medos
fitar unicamente, sob as luzes da cúpula, o voo tutelar da invisível armada

- Mário Cesariny
in Manual de Prestidigitação

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