quinta-feira, dezembro 12, 2013

Dá-me um unguento de carne, loba


A pressa sem igual com que olho a tua pele
a urgência apertada com que inquieto o teu corpo
e este desassossego em que empapo a língua
para falar-lhe à tua carne e lamber a tua voz
são como ávidas gotas de estanho compassivo
que procura minorar as fendas da morte.

A planta do tempo chupa-nos os dias
abrindo-se como uma flor negra, abominável
e neste esplendor de hoje oculta-se a semente
de uma desapropriação calcinada e perversa
como a do deserto. No cálcio do tacto
há uma lenta cárie que nos invade logo após
o fim aterrador do tempo e da vida

Pressuroso e perdido unto-me da tua figura
e sou um vulto de homem e de louco e de cão
que a um tempo te percorre o corpo por um túnel
apavoradamente lambendo nas trevas

- Félix Grande
(tradução de José Eduardo Simões)

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