sábado, outubro 05, 2013

Lupe


Trabalhava na Guerrero, a umas poucas ruas da casa de Julián
e tinha 17 anos e perdera um filho.
A lembrança fazia-a chorar naquele quarto do Hotel Trébol,
espaçoso e escuro, com casa-de-banho e bidé, o sítio ideal
para viver durante alguns anos. O sítio ideal para escrever
um livro de memórias apócrifas ou um ramalhete
de poemas de terror. Lupe
era magra e tinha as pernas largas e manchadas
como os leopardos.
Da primeira vez nem sequer tive uma erecção:
nem esperava ter uma erecção. Lupe falou da sua vida
e do que para ela era a felicidade.
Passado uma semana voltámos a ver-nos. Encontrei-a
numa esquina ao lado de outras putinhas adolescentes,
apoiada no guarda-lamas de um velho Cadillac.
Julgo que nos alegrámos ao ver-nos. A partir de então
Lupe começou a contar-me coisas da sua vida, às vezes em lágrimas,
às vezes desabafando, quase sempre nus na cama,
a olhar o céu raso de mãos dadas.
O seu filho nasceu doente e Lupe prometeu à Virgem
que largaria o seu ofício se o seu bebé se curasse.
Manteve a promessa um ou dois meses mas acabou por ter de voltar.
Pouco depois o filho morreu e Lupe dizia que a culpa
era sua por não cumprir com a Virgem.
A Virgem levou-lhe o seu anjo por uma promessa não cumprida.
Eu não sabia o que dizer-lhe. Gostava de crianças, isso é certo,
mas ainda faltavam uns bons anos para que soubesse
o que é ter um filho.
Por isso ficava calado e pensava no estranho
que se tornava o silêncio daquele hotel.
Ou tinha as paredes muito grossas ou éramos os únicos ocupantes
ou os demais não abriam a boca nem para gemer.
Era tão fácil manipular a Lupe e sentires-te homem
e sentires-te um desgraçado. Era fácil conduzi-la
ao teu ritmo e era fácil ouvi-la referir
os últimos filmes de terror a que tinha assistido
no cinema Bucareli.
As suas pernas de leopardo amarravam-se à minha cintura
e escondia a cabeça no meu peito buscando-me os mamilos
ou o batimento do coração.
É isto o que te quero chupar, disse-me uma noite.
O quê, Lupe? O coração.


- Roberto Bolaño
in La Universidad Desconocida, Anagrama

Sem comentários: