segunda-feira, julho 08, 2013

2.


Não, não deixes fechadas
as portas da noite,
do vento, do relâmpago,
a do nunca visto.
Que estejam abertas sempre
elas, as conhecidas.
E todas, as incógnitas,
as que levam
aos largos caminhos
por traçar, no ar,
às rotas que andam
em busca de seus passos
com vontade obscura
e ainda não os encontraram
nos pontos cardeais.
Põe indicações altas,
maravilhas, luzeiros;
que se veja muito bem
que é aqui, que tudo está
a querer recebê-la.
Porque pode vir.
Hoje ou amanhã, ou dentro
de mil anos, ou no penúltimo
dia do mundo.

E tudo
tem que estar tão plano
como a larga espera.

Ainda que saiba que é inútil.
Que é um jogo meu, tudo,
o esperá-la assim
como a um sopro ou uma brisa,
temendo que tropece.
Porque quando ela vier
desatada, implacável,
para chegar a mim,
muralhas, nomes, tempos,
quebrar-se-ão todos,
desfeitos, trespassados
irresistivelmente
pelo grande vendaval
do seu amor, já presença.

- Pedro Salinas
in La voz a ti debida

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