Por uma só vez que tudo volte
a dar-se como nunca antes se dera!
Ritual do arado em pleno leito
e em pleno crucifixo dos campos,
tu sabias?: veio, como em agosto
os fermentos da alba, veio dando-se
desalteradamente e com que ciência
de entrega, com que verdade de arado.
Mas sempre leva ao mesmo: acha outros dons
que remover, a relva que tem por baixo
quando não uma colheita malograda.
Árvores de ribeira lavapássaros!
Na roupa estendida da neve
resta a pureza por lavar. Ovários
trémulos! Eu não alcanço o necessário,
o indispensável para as minhas duas mãos.
Antes a sua lunação se porá a arder,
humilde como o feno num estábulo.
Se nos ouvissem... Mas já daria no mesmo.
Quem terá escolhido a este arador, perplexo
perante ébrias sementes, pão quente
aos pedaços, sulco a sulco e grão a grão?
Abandonado assim a cumplicidades
de primavera e forno, a um lendário
dom, e a altanaria de minha casa
esgrimindo entre um puro luzir de astros...
Por uma só vez que tudo volte
a dar-se como nunca antes se dera!
- Claudio Rodríguez
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