Não é por chover que serei digno. Mas quando
o serei, em que momento? Entre a pausa
que vai de gota a gota? Se viesses
de súbito num par com a manhã,
a par deste crescente mês, sabendo,
como a chuva sabe da minha infância,
que uma coisa é vir e outra vir a mim
desde essa vez aquela para nada...
Se viesses já, que diria eu?
Cada ser cheira a silêncio e veloz
a visão desce sempre dos altos cumes.
Como o húmus dos campos, basta,
ao meu coração basta uma semente
para se dar até ao limite. Tal como basta,
não sei porquê, à nuvem. Que eficácia
a do amor. E chove. Ponho-me a pensar
que a chuva não tem o sal das lágrimas.
Talvez porque seja já um pouco mais digna.
E é pelo sol, por este vento, que alça
a vida, pela névoa dos montes,
pelo rochedo, na noite ainda mais rigorosa,
pelo longínquo mar. É pela única coisa
que purifica, pela que nos salva.
Gostaria de estar contigo não por ver-te
mas para ver o mesmo que tu, cada
coisa em que respiras como nesta
chuva de tanta simplicidade, que lava.
- Claudio Rodríguez
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