sexta-feira, março 09, 2012

TRABALHOS DO POETA

[1949]


VII

Escrevo sobre a mesa crepuscular, apoiando fortemente a pena sobre o seu peito quase vivo, que geme e recorda o bosque natal. A tinta negra abre as suas grandes asas. A lâmpada estala e cobre as minhas palavras de uma capa de vidros partidos. Um fragmento afiado de luz corta-me a mão direita. Continuo a escrever com esse coto que emana sombra. A noite entra no quarto, o muro em frente chega o seu focinho de pedra, grandes poços de ar interpõem-se entre a pena e o papel. Ah, um simples monossílabo bastaria para arrepiar o mundo. Mas esta noite não há espaço para mais nenhuma palavra.

- Octavio Paz
in Águila o sol?

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