terça-feira, janeiro 31, 2012

Bandoneón

O litúrgico harmônio das ruas,
o mais reles órgão alemão,
fez a travessia com os emigrantes
e chegou a um bordel em Buenos Aires.
Como um padre apóstata,
ali se foi arrastando por histórias
de solidão e de melancolia.
Sempre amei os tangos que escutava
em garoto, nas tardes de domingo:
meu pai e minha mãe bailando
para lá e para cá no corredor da casa.
É a voz de uma épica perdida,
com os bandoneones arrastando
letras que falam de um amor culpável.
Os que bailam naquele corredor
hoje já vivem dentro de um tango
que, misteriosamente feliz, canta
um velho que sorri em passe de dança
aproximando-se da Desconhecida.

- Joan Margarit
in Misteriosamente feliz, Visor

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