domingo, novembro 06, 2011

VI

Às vezes, as mulheres casam-se com o ruído, têm filhos com a morte. São pactos definitivos, contra os quais nada podemos. Moram, de aí em diante, para lá da redenção, mesmo que seja numa rua solarenga. Moram na terra dos homens, onde, está bom de ver, só um buraco lhes será destinado. O ralo de um lavatório onde afogar a alma. É muito comum. Acontece todos os dias. Acontece quando vendem os sonhos como se fossem só horas de trabalho ou legumes malsões. Quando crêem que a realidade existe mesmo e que não há veleiros para a lua. Quando não vigiam a ilusão. Quando deixam a estupidez vencer. A facilidade. O imediato. O palpável. O masculino. A goma-laca com que selar os poros ao desejo. Quando trocam um rosário de minetes pelo ronronar fabril de todas as famílias.
Tenham cuidado. Muito cuidado. Ou acordarão zombies, rodeadas de cadáveres. E com o Céu, e os seus animais místicos, turvados, fantasmagóricos, liquefeitos. E pelo meio um rio em combustão.

- Miguel Martins

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