terça-feira, setembro 13, 2011

Argumento

Como viver sem desconhecido diante de nós?
Os homens de hoje em dia querem que o poema seja à imagem das suas vidas, com tão poucas considerações, tão pouco espaço, consumidas de intolerância.
Porque já não lhes é permitido agir supremamente, nessa preocupação fatal com a auto-destruição através dos seus semelhantes, porque a sua riqueza inerte os refreia e os amarra, os homens de hoje em dia, debilitado o instinto, perdem, muito embora se conservem vivos, a própria poeira do seu nome.
Nascido do chamamento do porvir e da angústia da retenção, o poema, elevando-se do seu poço de lama e de estrelas, testemunhará, quase silenciosamente, que nada havia nele que não existisse verdadeiramente noutro sítio, neste rebelde e solitário mundo de contradições.

- René Char
(tradução de Margarida Vale de Gato)
in Furor e Mistério, Relógio d'Água

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