O limoeiro lânguido suspende
uma rama pálida, poeirenta
sobre o encanto dessa fonte límpida
e submersos sonham nela
os frutos de ouro...
_____________É uma tarde clara,
quase de primavera,
morna tarde de março
que o hálito de abril próximo leva:
estou sozinho no pátio silencioso,
buscando uma ilusão cândida e velha,
alguma sombra sobre o branco muro,
uma lembrança no peitoril de pedra
da fonte adormecida, ou, no espaço,
o vaguear de uma túnica ligeira.
Flutua no ambiente dessa tarde
esse aroma de ausência,
que diz à alma luminosa: nunca,
e ao coração: espera.
Esse aroma evocativo dos fantasmas
das fragrâncias virginais e já desfeitas.
Oh, sim, recordo-te, tarde alegre e clara,
quase de primavera,
tarde sem flores, quando me trazias
o bom perfume da hortelã-pimenta
e da boa alfavaca
que em vasos minha mãe tinha à nossa beira.
Que viste eu mergulhar minhas mãos puras
nessa água serena,
para alcançar os frutos encantados
que hoje sonham na fonte que os espelha...
Sim, conheço-te, tarde alegre e clara,
quase de primavera.
- Antonio Machado
(tradução de José Bento)
in Antologia da poesia espanhola contemporânea, Assírio & Alvim
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