“Falo de mim”: Sem margem para dúvida, um caminho deveras meritório. No caso de AMCV, não só por causa dessa postura, prefiro acreditar, resultou:
“Foi condecorado com a Banda da Cruz de Mérito, a Grã Cruz da Falange Galega, o Grande Oficialato da Ordem do Infante D. Henrique e a Medalha de Mérito Cultural da Cidade de Viana do Castelo.”
Falange Galega? Abrenúncio! Será que aceitou tal distinção? Se sim, todas as distinções serão aceitáveis? E o preço disso? A conformidade com a moda? A premência do reconhecimento no curto prazo? Enfim, como sempre, cada um sabe de si, e pouco mais sobra, excepto: Tudo vale. Esta democracia é linda. Recolham flores - únicas, de preferência – tal e qual como na procissão do Senhor Morto, disponham-nas com estética bastante, e a vossa ruas terão o prémio que merecem.
Não sei o que é que os prémios fazem ou não fazem por um poeta. Pela poesia duvido que façam muito, mas às vezes são uma chamada de atenção merecida.
Aproveito e deixo-lhe mais um do senhor António Manuel Couto Viana:
O AVESTRUZ LÍRICO
Avestruz: O sarcasmo de duas asas breves (Ânsia frustrada de espaço e luz, De coisas frágeis, líricas, leves);
Patas afeitas ao chão; Voar? Até onde o pescoço dá. Bicho sem classificação: Nem cá, nem lá.
Isto sou. (Dói-me a ironia – Pudor nem eu sei de quê.) Daí a absurda fantasia De me esconder na poesia, Por crer que ninguém a lê.
___________
Não sei se lhe posso dizer alguma coisa. Estamos sozinhos, escrevemos, arranjamos ilusões - como a de não estarmos assim tão sozinhos - e no fim estamos sozinhos outra vez. Assim, os prémios (como os leitores) não hão-de fazer mal nem bem, fazem parte da ilusão.
Francamente, não sei porque escrevi aquele comentário. A sério. Na altura, estava a ouvir Anything Goes, de Cole Porter, e a ler uma notícia antiga em que o pai de Michael Jackson referia uma receita de soufflé de camarão. Acho que o comentário saiu como saiu e carreguei no publicar, sem pensar duas vezes. Voltei a lê-lo agora e não o entendi. Devo ter achado estranho aquele prémio de uma organização fascista galega e, para além da náusea com a imagem do soufflé de camarão, não me lembro de muito mais. Mesmo continuando a discordar com a atitude implícita no poema, acho-o muito bem escrito. O mesmo vale para O Avestruz Lírico - um título fabuloso, diga-se de passagem.
O José Quintas não está enganado. A.M. Couto Viana foi um poeta do stablishment nacional fascista, o que não quer dizer nada. Também Erza Pound, entre outros, perfilhou o fascismo de Mussolini, foi engaiolado (é o termo) pelos seus compatriotas americanos no fim da guerra e é, a meu ver, um dos maiores poetas do séc. XX, pouco citado e nada visto na blogoesfera porque não é de moda, essa coisa parva. Mas não lhe conheço poemas apologéticos, como dois aqui transcritos de A. M. Couto Viana, Portugal e O Poeta e O Mundo, poemas mais que infelizes. O primeiro porque falta à verdade histórica (fomos colonizadores colonizados), a favor da ideia fascista de um império brilhante (e podre); o segundo, porque, não se querendo um poema social, o é, e activamente alheio à injustiça verberada em poesia desde Homero (pese mais uma vez a moda e o fantasma do neo-realismo). De outros que aqui tenho lido, nada a dizer.
4 comentários:
“Falo de mim”:
Sem margem para dúvida,
um caminho deveras meritório.
No caso de AMCV,
não só por causa dessa postura, prefiro acreditar,
resultou:
“Foi condecorado com a Banda da Cruz de Mérito, a Grã Cruz da Falange Galega, o Grande Oficialato da Ordem do Infante D. Henrique e a Medalha de Mérito Cultural da Cidade de Viana do Castelo.”
Falange Galega? Abrenúncio!
Será que aceitou tal distinção?
Se sim, todas as distinções serão aceitáveis?
E o preço disso?
A conformidade com a moda?
A premência do reconhecimento no curto prazo?
Enfim,
como sempre,
cada um sabe de si,
e pouco mais sobra,
excepto:
Tudo vale.
Esta democracia é linda.
Recolham flores
- únicas, de preferência –
tal e qual como na procissão do Senhor Morto,
disponham-nas com estética bastante,
e a vossa ruas terão o prémio
que merecem.
Não sei o que é que os prémios fazem ou não fazem por um poeta. Pela poesia duvido que façam muito, mas às vezes são uma chamada de atenção merecida.
Aproveito e deixo-lhe mais um do senhor António Manuel Couto Viana:
O AVESTRUZ LÍRICO
Avestruz:
O sarcasmo de duas asas breves
(Ânsia frustrada de espaço e luz,
De coisas frágeis, líricas, leves);
Patas afeitas ao chão;
Voar? Até onde o pescoço dá.
Bicho sem classificação:
Nem cá, nem lá.
Isto sou. (Dói-me a ironia
– Pudor nem eu sei de quê.)
Daí a absurda fantasia
De me esconder na poesia,
Por crer que ninguém a lê.
___________
Não sei se lhe posso dizer alguma coisa. Estamos sozinhos, escrevemos, arranjamos ilusões - como a de não estarmos assim tão sozinhos - e no fim estamos sozinhos outra vez. Assim, os prémios (como os leitores) não hão-de fazer mal nem bem, fazem parte da ilusão.
Francamente, não sei porque escrevi aquele comentário. A sério. Na altura, estava a ouvir Anything Goes, de Cole Porter, e a ler uma notícia antiga em que o pai de Michael Jackson referia uma receita de soufflé de camarão. Acho que o comentário saiu como saiu e carreguei no publicar, sem pensar duas vezes. Voltei a lê-lo agora e não o entendi. Devo ter achado estranho aquele prémio de uma organização fascista galega e, para além da náusea com a imagem do soufflé de camarão, não me lembro de muito mais. Mesmo continuando a discordar com a atitude implícita no poema, acho-o muito bem escrito. O mesmo vale para O Avestruz Lírico - um título fabuloso, diga-se de passagem.
O José Quintas não está enganado. A.M. Couto Viana foi um poeta do stablishment nacional fascista, o que não quer dizer nada. Também Erza Pound, entre outros, perfilhou o fascismo de Mussolini, foi engaiolado (é o termo) pelos seus compatriotas americanos no fim da guerra e é, a meu ver, um dos maiores poetas do séc. XX, pouco citado e nada visto na blogoesfera porque não é de moda, essa coisa parva. Mas não lhe conheço poemas apologéticos, como dois aqui transcritos de A. M. Couto Viana, Portugal e O Poeta e O Mundo, poemas mais que infelizes. O primeiro porque falta à verdade histórica (fomos colonizadores colonizados), a favor da ideia fascista de um império brilhante (e podre); o segundo, porque, não se querendo um poema social, o é, e activamente alheio à injustiça verberada em poesia desde Homero (pese mais uma vez a moda e o fantasma do neo-realismo). De outros que aqui tenho lido, nada a dizer.
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