domingo, março 23, 2008

“You flicker. I cannot touch you.
I put my hands among the flames. Nothing burns.”
Crossing the Water,
Sylvia Plath


reluz a garganta de metal
como se quisesse engolir cada sombra de cada ruído
como se falar fosse voltar atrás obsessivamente
e redescobrir o heterónimo fechado nos dedos
e o aço natural da voz,
da boca ensanguentada e nua, deserta
como a minha humildade menos falsa.
a sorte habita lugares nauseabundos
onde a ferrugem do oxigénio se mistura com a saliva dos retratos.
mas hoje é dia de envelhecer e o fôlego pesa
porque os destinos tropeçam à minha frente
e a minha frente é um mês inclinado
para trás.
é verdade que nos amamos, e é verdade que
nos podíamos violar mutuamente
como quando cada esquecimento arde
e uma chama se alastra dolorosamente pelos tendões da consciência
e precisamos de um suicídio rápido, ordenado, talvez cultural.
os subúrbios do Inverno,
a brancura selvagem do silêncio,
as árvores negras que me bebem o suor.
oh, a terrível ternura da obsessão!

Sara F. Costa

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