não é assim tão difícil apagar as provas que deixámos,
nem só um acto criminoso põe fim a uma vida
há outros meios, o rumo que o silêncio nos ensina
a utilidade das gavetas e dos armários
tudo o que podemos deitar fora, meter no lixo
sem rituais incendiários nem despedidas
no final do dia se quiseres sairemos incólumes daqui
havemos de pernoitar por uns tempos
dividindo a solidão num lugar
onde deixaremos sempre as desilusões acesas
podemos permanecer quietos com os gatos, e se quiseres
estenderemos sinais perpetuando a vida de algumas sombras
através da escrita, aproveitando a indulgência nocturna
aliciando bosquejos lunares ou libertando miniaturas de aves
aquilo que pudermos dispor nos limites da folha,
levantando voo para além da melancolia
ou pousando nas quebras horizontais
- temos um mundo inteiro para esquecer -
esse será o nosso quid pro quo,
tu não me perguntas nada e eu hei-de inventar
motivos para desconversarmos até se apagarem
todos os tumores benignos que temos crivados na pele,
há tempo, a noite será tão longa e escura
quanto precisemos que ela seja e, quando fizermos
as pazes com o sol, nada voltará a ser como dantes
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