o projecto ou memória do que fui
António Franco Alexandre
O pulso ferve nesta tarde de Verão. Passam 10 minutos das 16:00 horas e penso, pelo suor que percorre um fio da minha testa, que a temperatura deve rondar os 38 graus. Sinto a comichão natural dos fluídos que se querem libertar e encontram essa muralha de pele que envolve o medidor da vida, o medidor do tempo. E a comichão não pára. Recuso-me, porém a libertar a anilha que prende o tempo ao meu pulso, recuso-me mesmo perante o incómodo físico que me proporciona. Recuso-me porque não me quero perder, porque o tempo é um híbrido: é amante e traidor, sendo-o, no entanto, fiel e a ele devo a minha fidelidade também. O tempo não é apenas tempo, cada segundo passado é uma traição à eternidade, mas uma traição amada e grata pela oportunidade de ver os ponteiros dirigirem-se para a direita, num movimento circular: início e fim: meio-dia e meia-noite. Somos isso mesmo meia-vida, meia-morte. Sendo a certeza que essa meia-vida vale por si só a saudade que dela tenho quando oiço finalmente as doze badaladas. O tempo é futuro? O tempo é passado? O tempo é, afinal, apenas tempo. O futuro e o passado são construções humanas e ninguém me pode proibir de sentir saudade do futuro porque ele é o meu passado.
Marta Antunes
O tempo confunde-se em mim. Dou-lhe uma trinca de manhã e mastigo-o ao longo do dia, o meu corpo absorve-o à noite. E os dias que deveriam estar, logicamente pensando, alinhados numa recta por ordem crescente, formam uma circunferência que gira no sentido inverso ao dos ponteiros do relógio, organizados sem sequência. Amanhã posso voltar a ser criança, o que incomoda muito os adultos porque não têm os meus espelhos nas suas casas.
Agora é isto tudo que foi e que será. Talvez volte a ter cabelo liso como na fotografia de 1990. As horas não têm todas o mesmo tamanho e martelam no corpo a intensidades diferentes. Houve alguns dias que não foram vividos e houve semanas vividas em poucos minutos. Há rugas leves e longos risos infantis para o tempo enfeitar.
No calendário é tão fácil: os números seguem-se e forma quadrados encaixados em quadrados. Em mim o tempo não encaixa assim. Sou eu que encaixo nele, que me divido nos seus compartimentos, sem deixar de ser una. E assim ele passa a fazer parte de mim, baralhando o cubo mágico preenchido com a minha alma.
Ana Antunes
Marta Antunes
O tempo confunde-se em mim. Dou-lhe uma trinca de manhã e mastigo-o ao longo do dia, o meu corpo absorve-o à noite. E os dias que deveriam estar, logicamente pensando, alinhados numa recta por ordem crescente, formam uma circunferência que gira no sentido inverso ao dos ponteiros do relógio, organizados sem sequência. Amanhã posso voltar a ser criança, o que incomoda muito os adultos porque não têm os meus espelhos nas suas casas.
Agora é isto tudo que foi e que será. Talvez volte a ter cabelo liso como na fotografia de 1990. As horas não têm todas o mesmo tamanho e martelam no corpo a intensidades diferentes. Houve alguns dias que não foram vividos e houve semanas vividas em poucos minutos. Há rugas leves e longos risos infantis para o tempo enfeitar.
No calendário é tão fácil: os números seguem-se e forma quadrados encaixados em quadrados. Em mim o tempo não encaixa assim. Sou eu que encaixo nele, que me divido nos seus compartimentos, sem deixar de ser una. E assim ele passa a fazer parte de mim, baralhando o cubo mágico preenchido com a minha alma.
Ana Antunes

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