segunda-feira, janeiro 28, 2008

Case File #

A quem às vezes por aqui passa
segredamos coisas ininteligíveis
com o inexplicável propósito de as fazer parar,
fingimos citar de cor versos de poetas
suficientemente estrangeiros para que pareçam
saber mais do que o que se consegue saber neste país
de derrotas aceites com grande parcimónia.
Já nos cansámos de ler os génios, lemos agora
as legendas nos livros de botânica,
as instruções (para retardados)
que vêm com os electrodomésticos,
chegamos ao ponto de procurar inspiração
nos códigos da depressiva ordem jurídica
onde nos parece que há sempre uma lei lá no meio
que o legislador terá escrito depois de ler
as iluminações de Rimbaud, com uma inconsolável dor
de se saber perdido, ao fim de tantos anos,
do lado errado da lei.

O mundo está todo ele muito triste e chora de noite
à espera talvez que apareça um gajo estuporado
com uma messiânica mensagem carregada de non-sense,
essa qualidade inábil que sem exigir nada de nós
parece ser o único caminho, senão para a salvação,
ao menos para a irresponsabilidade
desta nossa animal incipiência
perante os obstáculos burocráticos
que encontramos nesta repartição da vida
onde vimos carimbar os papéis
relativos ao nosso processo de extinção.

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