sexta-feira, dezembro 28, 2007



Mãe, eu quero ir-me embora - nenhum sorriso abre
caminho no meu rosto e os beijos azedam na minha boca.

Maria do Rosário Pedreira


Quando eu era pequena e precisava de um amigo para passar o tempo comigo, bastava perguntar a uma criança que passasse por mim no recreio se queria ser minha amiga. Algumas eram mais tímidas mas nunca me disseram não. E quando algum de nós se chateava dizia simplesmente "não sou mais teu amigo" e esse era ainda um último acto de amizade e a prova final que realmente aquele amigo existiu.
Hoje um amigo não é assim tão fácil. Ninguém tem tempo para isso. E, no entanto, os que julgo serem-no, apenas os rotulo como garantidos na dúbia realidade. Uma mão sobre a minha mão sabe-me a um ramo seco, quase sempre.
Quando eu era pequena, o meu riso era solto, vinha do fundo e esquecia-se no ar sem ser pensado.
Hoje uma gargalhada é um espasmo nervoso que me incomoda e que a atmosfera não consegue absorver de tão denso ser.
Na escola ensinaram-me a ver as horas. Antes desse dia não havia tempo, sabia apenas que o dia nascia, morria e renascia sempre. Depois comecei a contar as escassas horas de um dia que se localiza no calendário e que nasce daí mesmo e não da magia do sol.
Não me lembro de dias frios na minha infância e quando chovia, eu dormia confortável na minha cama.
Hoje são raros os dias solarengos e o calor da alma.
Mãe, embala-me num último sono e faz-me nascer mais uma vez, leva-me para outro tempo longe daqui, onde eu não saiba contar e onde não importe em que sítio me encontro.

Sem comentários: