quarta-feira, setembro 09, 2015


Para não nos perdermos do encanto,
à sombra que cada gesto afugenta, tomamos
o desenho, um contorno seguido
como se da inspiração houvéramos de erguer
um corpo: outro, ardente de se mover
contra a luz. Como em nós reza uma falha
desumana, antecipação que não nos deixa quietos,
observamos sob o murmúrio dos lugares imediatos,
das coisas neles, sua gravidade insípida,
sinais de vida suspensa, os óculos
pousados, baça promessa de paisagens.
Uma natureza que em tempos caçou
de tudo, perseguiu com um sentido de fatalidade
quase lúdico. Lembramo-nos da fome, nos genes.
Embalada, a ameaça, fraqueza que nos deixaria
pelo caminho, como oferendas
ao mortífero oportunismo do que
a qualquer instante nos cerca. A tudo,
esta noção sobreviveu, e um só conselho:
ter claro que melhoramos as nossas chances
não permanecendo num mesmo lugar, alvos
para a descoberta do que passa. Sermos nós
os arrastados, enfim devorados. Eis-nos,
predadores pacíficos. Ainda assim resiste,
dormente, a impressão de que a vida
desenha uma recta, de que algo nos segue
até ultrapassar-nos. A luz que deixa de
amparar-nos, a sombra que passa para
as nossas costas e só aguarda que, cegos,
tropecemos.

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