terça-feira, julho 21, 2015


Não é a catástrofe
que, como luz difusa, paira
sobre a espera, sem fim.
(Há um instante em que percebes,
com sentidos que nunca soubeste
teus, a vibração
de uma corda estendida
de sol a sol,
uma corda que vibra
sem movimento, e é
por isso o próprio temor.)
Mas não
é sequer essa corda
nem a sua sombra na água.

Também não é o sabor,
frutado ou obsceno, do instante
em que abres a janela e já é noite
e tu não esperavas
essa brisa que te desarma.
Nem é a imensidão de um amor
que não queres medir
para alimentá-lo em segredo.

(Às vezes, após colher
uma flor, fica-nos na boca o gosto
a sangue; depois do mais
inocente dos nossos passos,
eleva-se um perfume de vingança.)
Mas também não é um punhado
de pétalas, nem é uma
pegada na terra. (Nem uma
promessa, uma desculpa, um esquecimento,
uma metamorfose, uma morte
nem uma ressurreição.)

É o poema que julgavas teu
e que não hás-de escrever nunca.

- Ángel Crespo

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