segunda-feira, fevereiro 24, 2014


No falar comum, o «pensamento» é democratizado. Torna-se universal e sem autoridade. Mas confundem-se assim radicalmente fenómenos distintos, ou até mesmo antagónicos. Responsavelmente definido – falta-nos um termo que o assinale –, o pensamento sério é uma ocorrência rara. A disciplina que, juntamente com a abstenção da facilidade e da desordem, o pensamento requer só muito raramente ou nunca está ao alcance da grande maioria. A maior parte de nós não tem mais do que uma vaga ideia do que seja «pensar», transformar em «pensamento» o bric-à-brac, o refugo e o lixo da nossa corrente mental. Adequadamente concebida – quando paramos para pensar no assunto? –, a instauração de um pensamento de primeira ordem é tão rara como a composição de um soneto de Shakespeare ou de uma fuga de Bach. Talvez, na breve história da nossa evolução, não tenhamos ainda aprendido a pensar. Excepto para um punhado entre nós, talvez a designação de homo sapiens não passe de uma vanglória injustificada.

- George Steiner
in A Poesia do Pensamento, Relógio d'Água

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