O Melhor Amigo

OS HOMENS A SÉRIO NÃO DANÇAM
Uma estrutura de sombras no continente americano

Dirigida por Norman Mailer

Os homens a sério não dançam
Os homens a sério chegam a povoados limítrofes em horas escuras
Os homens a sério não têm dinheiro, desbaratam-no, buscam um resto de dinheiro em habitações minúsculas e húmidas
Os homens a sério não usam pijama
Os homens a sério têm vergas grandes e duras que o tempo vai encurtando e amolecendo
Os homens a sério seguram as vergas com uma mão e mijam à vontade em terrenos escarpados e desertos
Os homens a sério viajam em comboios de carga pelas grandes distâncias da América do Norte
Os grandes cenários dos filmes de série B
Filmes violentos onde o autarca é um sacana e o xerife um filho da puta e as coisas vão de mal a pior
Até que aparece um homem a sério disparando à direita e à esquerda
Peitos rebentados por balas de alto calibre projectam-se
Na nossa direcção
Como hóstias de redenção definitiva
Os homens a sério fazem amor com as camareiras
Em quartinhos femininos decorados de um jeito rasca
E desaparecem antes que amanheça
Os homens a sério viajam em transportes miseráveis pelas grandes distâncias da América Latina
Os homens a sério partilham a paisagem das viagens e a sua melancolia com porcos e galinhas
Para trás ficam bosques, planaltos, montanhas como dentes de tubarões, rios sem nome, esforços em vão
Os homens a sério recolhem as migalhas da memória sem uma queixa
Temos comido, dizem, temos fodido, temo-nos drogado, conversado até ao amanhecer com amigos de verdade
Que mais podemos desejar?
Os homens a sério deixam os seus filhos espalhados pelas grandes distâncias da América do Norte e da América Latina
Antes de enfrentarem a morte
Antes de receberem com o rosto esvaziado de esperanças a visita da Velha, da Ossuda
Antes de receberem com o rosto enrugado pela indiferença a visita da Madrinha, da Soberana
Da Avezorra, da Peluda, da Mais Feia do Baile
Da Mais Feia e a mais Apontada do Baile

- Roberto Bolaño
in La Universidad Desconocida, Anagrama