sexta-feira, agosto 16, 2013

17.


Amor, amor, catástrofe.
Que perdição do mundo!
Um grande horror a tectos
quebra colunas, tempos;
substitui-os por céus
intemporais. Andas, ando
por entre escombros
de estios e de invernos
derrubados. Extinguem-se
as regras e as medidas.
Toda até lá atrás a vida
vai perdendo séculos,
frenética, do seu cimo;
desfaz-se, galopando,
seu curso, lento antes;
desvive-se de ânsia
de apagar a história,
de não ser mais que o puro
anelo de começar-se
outra vez. O futuro
chama-se ontem. Ontem
oculto, secretíssimo,
que se nos esqueceu
e há que reconquistar
com o sangue e a alma,
atrás daqueles outros
ontens conhecidos.
Atrás e sempre atrás!
Retrocessos, em vertigem,
por dentro, até amanhã!
Que tudo caia! Já
o sinto apenas. Vamos,
tu e eu
por entre o grande fracasso
da flor e da ordem.
Já pressinto entre tactos,
entre abraços, tua pele
que me entrega o retorno
ao primeiro bater,
sem luz, antes do mundo,
total, sem forma, caos.


- Pedro Salinas
in La voz a ti debida

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