domingo, julho 21, 2013

11.


Ali, atrás desse sorriso,
já não se te reconhece.
Vais e vens, resvalas
por um mundo de valsas
geladas, costa abaixo;
e ao passar, por capricho,
os mais ágeis arrebatam-te
beijos sem vocação,
a ti, a momentânea
cativa do que é fácil.
"Que alegre!", todos dizem.
E é então que estás
querendo ser a tua outra,
parecendo-se tanto
a ti mesma, que tenho
medo de perder-te, assim.

Sigo-te. Espero. Sei
que quando não te olhem
túneis ou luzeiros,
quando o mundo julgue
que já sabe quem és
e diga: "Sim, já sei",
irás desenredar-te,
com os braços ao alto,
atrás do teu cabelo,
o enlace, olhando-me.
Sem ruído de copos
cairá ao chão,
careta vazia
inútil já, o sorriso.
E ao ver-te no amor
que sempre te estendo
como um espelho ardendo,
tu reconhecerás
um rosto sério, grave,
uma desconhecida
alta, pálida e triste,
que é minha amada. E que,
atrás do seu sorriso, me quer.

- Pedro Salinas
in La voz a ti debida

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