terça-feira, abril 09, 2013

Dois irmãos

 
Duas camas, lado a lado. Na penumbra do anoitecer, obedecendo às exigências da escola, ouvíamos música, ora sonhadora ora melancólica, narrávamos filmes vistos por um só, e ensaiávamos pensar e falar como quem pensa e lê, até que a simplicidade do sono nos resgatasse ao espanto das possibilidades infinitas. Começavam, assim, os meus trabalhos, que não mais pararam e me têm conduzido, sem pousio, entre luzes e trevas.

Ele, há muito, escolheu a imobilidade, as sombras amenas, nunca solares, nunca atras – um frescor, apenas, embalando a pele. Aquele quantum satis em que as penas soçobram sob o rolo da fleuma. Isto é: deixou de pensar ou, melhor dizendo, escolheu deixar de acreditar no pensamento. E, creio, não por convicção mas por conforto.
 
A história é comum e é a história de como se mata uma geração – não tanto a dos próprios, ainda com memória e, portanto, vergonha; quase sempre a seguinte, ignorante da possibilidade alternativa.
 
Cabe-me a mim educar os seus netos.
 
- Miguel Martins

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