sexta-feira, março 22, 2013

COLÓFON
ESCRITO AO CORRIGIR AS PROVAS DO VOLUME
«ENSEÑANZAS DE LA EDAD»; PARA CARLOS BARRAL
POETA E EDITOR DE POETAS

(E com a lembrança da «Balada
dos enforcados», de Villon)

Companheiros, poetas do futuro,
sede generosos connosco; tentem
compreender como foi realmente duro
esta inútil vida vagueando,
este fracasso, enfim, esta debilidade.
Enforcados nos vêem, nos vossos dias,
antes de sermos esquecidos nas bibliografias,
apenas esse apagado gesto tradicional,
ossos no vento das antologias,
no árido pó das teses de doutoramento.

Irmãos, poetas de amanhã:
se ainda vos sobrar imaginação,
pensem que mau negócio é esta vã
consciência nunca em paz dos que são
poetas de uma «era de transição».
Direis:  «Não chegaram para uma, pobre gente:
trabalhando o sublime, de repente
quiseram o real, e era tarde.»
E não sabeis que hoje temos como valente
o que não passa de um covarde.

Vós não estareis tão divididos,
querendo ao mesmo tempo estar atentos
ao eu nas suas mais recônditas pulsações
e à dor do próximo esfomeado
pisado pelos ricos e violentos.
Nascidos entre justiça e cultura,
talvez sejais a voz lúcida e madura
do mundo, e, na vossa bela perspectiva,
já não recordareis, olhando daí,
o nosso torpe tentear, à deriva.

Mas se sois benévolos, irmãos,
e encontrarmos mercê nas vossas mãos,
por esses corações sereis amados
por poetas de outros séculos mais distantes:
e que boa diferença isso vos poderá fazer também!

- José María Valverde
in Poesias Reunidas, Lumen

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