E uma nova chama ao meu fogo interno
A alma tem o seu ofício de pesadelos
Que é como uma água de recordações
Ou de árvores que se movem para se assemelharem ao mar
Sinto algo subir das minhas regiões negras
Que pretende devolver-me ao céu
Talvez oferecer as minhas ânsias à estrela que quis apadrinhar-me
Há uma voz desterrada que persiste nos meus sonhos
Que chega atravessando-me desde os meus primeiros dias
E que cruzou a imensa cadeia dos meus ascendentes
Há uma luz de carne que persiste nas minhas noites
Que se prende a certas almas com os seus raios
Há uma esperança devoradora
Um presságio que culmina tocado pelas minhas mãos
Um presságio ascendendo como uma flor de sede
Mais poderoso que o cântico das lonjuras escutado pelo prisioneiro
Há algo que quer fazer que nasçam os meus modos não nascidos
Os pedaços ignorados do meu ser silencioso
Tanto do que ficou à margem em labirintos insaciáveis
Ou do que foi levado pelos espelhos mortais sem perceber o perigo das sombras
Há uma noção de lágrimas e cálidas palavras
Que também chegaram atravessando rios
E épocas como cidades enterradas
Há um trabalho de raízes sem sonho
E ao mesmo tempo uma formação de distâncias
Pela qual sangraremos a certas horas
Há um bater de coisas que amadurecem as trevas
E buscam a sua palavra precisa para viver entre nós
Buscam o seu olor distinto como o faz cada flor
De tudo isto será feito o nosso futuro
E há também o desfrute dos sinos desfazendo-se do seu imenso alarido
Ó transparência da solidão!
Ó liberdade de augúrio suspendido!
Ó filtro da íntima consciência chorando o seu destino!
Escutaste tantas vezes a tua própria voz
Agonizando suspensa de certas células
Sem vontade de espanto...
Escuta agora a voz do mundo
Olha a vida que ondula como uma árvore chamando o sol
Quando um homem toca as suas raízes
A terra canta com os astros irmãos
- Vicente Huidobro
in El ciudadano del olvido
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