raramente se descreve. É, de certo modo, a expressão de uma clandestinidade. Não regressamos como regressamos à memória da paixão ou do desejo. É sempre o desgosto que regressa a nós. Não se revisita o que nos desgostou. Por vezes, tentamo-lo, mas somos repelidos. Porque há nessa revisitação um sarro, o «gosto amargo» do vómito. Só o lugar-comum o revela na sua vulgaridade. O desgosto subtrai: palavras, risos, lágrimas. Emudece, não para aproximar, como no amor, mas para afastar. Este movimento, no entanto, não gera uma viagem. É quase um enfado. O sinal de uma persistência incómoda. Alguns dizem: os desgostos matam:
há quem viva perdas menores como tragédias.
Figuras do desgosto: calúnia, inveja, traição, mentira.
Figuras da tragédia: morte, Deus, injustiça, mal.
- Rui Nunes
in Barro, Relógio d'Água
quinta-feira, maio 03, 2012
desgosto
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poesia de fora
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